Robert Crumb: do underground à autoexposição

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“Não estou aqui para ser educado!”, diz Crumb, em autorretrato.

No fim dos anos 1960 e início dos 1970, surgem, nos Estados Unidos, os underground comix, histórias em quadrinhos que não dependiam do aval nem da prensa das grandes editoras da época, e que iam na contramão do que era mais produzido até então – histórias de super-heróis. Eram publicadas de forma independente, muitas vezes no formato fanzine, e abordavam temas como o uso de drogas ilícitas, sexualidade e violência, temas esses que jamais passariam, à época, pelo escrutínio do Comics Code Authority – órgão regulador das publicações em quadrinhos que proibia a representação gráfica de violência, principalmente de forma extrema, nas histórias de crime e terror, além de insinuações sexuais de personagens femininas.

É nesse contexto e cenário que Robert Crumb se insere. Cartunista, ficou a princípio conhecido por suas histórias inspiradas pelo uso do LSD e por encabeçar a Zap! Comix, famosa publicação independente da época. Com o sucesso, fruto de suas criações psicodélicas e nonsense, além da capa do disco Cheap Thrills – famosa por seus vários desenhos de Janis Joplin –, Crumb vira uma celebridade da contracultura e da cena hippie, com suas ilustrações estampando camisas, pôsteres e memorabilia, tornando-o um “herói da cultura underground” (palavras do próprio Crumb).

Após o declínio dos underground comix, no fim da década de 1970, Crumb volta suas publicações para o biográfico e o autobiográfico, retratando, por exemplo, histórias de ícones não tão conhecidos do blues – gênero musical do qual é fã confesso. Sobre si, admite que sempre almejou a fama, desde criança, e que agora poderia rejeitar quem o rejeitou. Esse sentimento serve de mote para que não tenha medo de se expor; passa a retratar principalmente os seus problemas com as mulheres, que dá origem a uma série – sabiamente intitulada –, “Meus Problemas com as Mulheres”, onde mostra, de forma bastante gráfica e sem pudores, o quanto é fascinado por elas, além de explicitar, seja com imagens ou palavras, seus desejos e seus atos sexuais mais sujos e íntimos – segundo Crumb, fruto da sua criação católica, que o deixou sexualmente reprimido por muito tempo. Sempre fiel ao se ilustrar, alto e esquálido, desenha “suas” mulheres como amazonas, robustas e cheias de curvas, que viria a render-lhe acusações de machismo e misoginia, de ser pervertido e mentalmente perturbado.

No documentário Crumb, de 1994, R. Crumb demonstra que é consciente do teor do seu trabalho e do alcance ofensivo que tem ao dar uma declaração que revela sua faceta atormentada, e que tem o tom de suas publicações confessionais e autobiográficas: “Eu apenas espero que, de alguma forma, revelar a verdade sobre mim ajude de alguma forma. Não sei. Espero que sim, mas eu tenho que fazê-lo. Talvez não devesse ser permitido. Talvez eu devesse ser trancafiado e ter meus lápis tomados de mim, apenas não sei. Não dá pra dizer, sabe? Não sei me defender”.

(por Bernardo Machado)

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